sábado, 20 de março de 2010

Do Talento dos amigos

Nesta postagem, bem como nas próximas (três), cedo o espaço para os textos de amigos e amigas que surpreendem pela vida, pela arte, pela linguagem...


A César o que é de César


(Vicência Jaguaribe)


Não tem jeito, a dor não morre.
Muito menos dorme.
Por mais que lute e me esforce
Ela está lá, de sentinela.
Sempre à espreita, sempre à espera.
Ao menor vacilo, à mínima brecha,
Ela não hesita. Mostra-se, entrega-se.

Já tentei entretê-la,
Procurei convencê-la.
Expus-lhe todas as razões
Falei-lhe da inutilidade das ilusões.
Mas ela, com um riso de ironia,
Acenou-me falando da tirania
Que governa as razões dos corações.

Ela, às vezes, se faz de surda,
Faz ouvido de mercador.
E me joga na enxurrada,
Sem o mínimo pudor.

Ri das minhas tentativas,
Zomba das minhas angústias.
Ironiza o meu luto.
Até me acusou de teimosia:
Quem já foi feliz um dia
Precisa pagar tributo.

- Não julgue que algo se constrói
Sem que se pague a César
O que é de César.
Disse-me com ar de quem corrói.

- E nos batem à porta,
Às horas mortas,
Aqueles que prescrevem:
Há sempre um César
A cobrar o que lhe devem.


Vicência:

É da dor que extraímos o travo da vida... que nos leva a outros sabores.

Vicência Jaguaribe é professora adjunta (aposentada) da Universidade Estadual do Ceará /UECE e Mestre em Letras pela Universidade Federal do Ceará.

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