domingo, 30 de maio de 2010

O discurso científico e a Semiótica


"O discurso da pesquisa é apanhado em sua própria contradição. Para poder dizer o que busca, ser-lhe-ia preciso já o ter encontrado. Se fosse esse o caso, porém, só lhe restaria calar-se, exceto se se tornasse outro, didático, por exemplo, ou, por que não, promocional. Inversamente, se ele fala, e até, se não para de falar, é porque seu próprio fim, em parte, continua a escapar-lhe. E, é claro, ao buscá-lo, ele se está buscando. É, portanto, duas vezes uma ausência (relativa), a do objeto, sempre a construir ou a reconstruir, e aquela que ele experimenta em relação a si mesmo, que o fundamenta e o motiva.

No entanto, já que assim é a lei do gênero, chega um momento em que ele precisa 'se apresentar': nomear-se mostrando-se, situar-se dizendo do que se ocupa, em suma, alegar o que é, como se conhecesse a própria identidade e soubesse exatamente o que faz, enunciando-se: como se fosse transparente ao próprio olhar e já inteiramente presente diante de si mesmo" (LANDOWSKI, E. Presenças do outro, ed. Perspectiva, São Paulo, p. 09)

* Intitulei esta foto de "A presença do sentido". Extraída do blog do Érico www.memoriasdaescrita.wordpress.com

terça-feira, 25 de maio de 2010

Belas e esquecidas canções I

Sem desmerecer o modo hodierno de se fazer, vender e apreciar música, em seus mais inusitados e mesclados "gêneros", devo dizer que sinto saudades da velha e boa MPB: linguística e poeticamente inteligente, harmônica e melodicamente rica, enfim: equilibrada e bela. Hoje ouvi, em restaurante vegetariano, duas pérolas de Gilberto Gil, dos tempos áureos de criação musical:
Pai e Mãe (Gilberto Gil)

Eu passei muito tempo aprendendo a beijar
Outros homens como beijo o meu pai
Eu passei muito tempo pra saber que a mulher
Que eu amei, que amo, que amarei
Será sempre a mulher como é minha mãe

Como é, minha mãe?
Como vão seus temores?
Meu pai, como vai?

Diga a ele que não se aborreça comigo
Quando me vir beijar outro homem qualquer
Diga a ele que eu quando beijo um amigo
Estou certo de ser alguém como ele é

Alguém com sua força pra me proteger
Alguém com seu carinho pra me confortar
Alguém com olhos e coração bem abertos
Para me compreender

A linha e o linho (Gilberto Gil)

É a sua vida que eu quero bordar na minha
Como se eu fosse o pano e você fosse a linha
E a agulha do real nas mãos da fantasia
Fosse bordando ponto a ponto nosso dia-a-dia
E fosse aparecendo aos poucos nosso amor
Os nossos sentimentos loucos, nosso amor
O zig-zag do tormento, as cores da alegria
A curva generosa da compreensão
Formando a pétala da rosa, da paixão

A sua vida o meu caminho, nosso amor
Você a linha e eu o linho, nosso amor
Nossa colcha de cama, nossa toalha de mesa
Reproduzidos no bordado
A casa, a estrada, a correnteza
O sol, a ave, a árvore, o ninho da beleza

domingo, 16 de maio de 2010

O inferno dos poetas

Tido como grande expoente do parnasianismo brasileiro, Olavo Bilac foi fortemente influenciado pela poesia francesa e, pelo visto, en passant, pela italiana. Em seus poemas, encontramos correção da linguagem, rigor da forma e forte apelo emocional. O poema abaixo, propositadamente, remete ao início de uma grande obra da literatura universal : "Nel mezzo del cammin di nostra vita / mi ritrovai per una selva oscura / ché la diritta via era smarrita" (Dante Alighieri, Divina Comédia, inferno, canto primo). Para o bom entendedor...belíssimo soneto:
Nel mezzo del camin...(Olavo Bilac)

Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha...

E paramos de súbito na estrada
Da vida: longos anos, presa à minha
A tua mão, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.

Hoje, segues de novo... Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece,
Nem te comove a dor da despedida.

E eu, solitário, volto a face, e tremo,
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo.