terça-feira, 1 de setembro de 2009

Lavoura Arcaica de Raduan Nassar



Não é exagero afirmar que Lavoura Arcaica é uma obra-prima da literatura brasileira. Quem já leu sabe disso. De estrutura densa, capaz de penetrar as superfícies movediças de temáticas como religião, família, incesto, sem se deixar engolir pelo previsível, o livro torna-se primoroso sobretudo pelo modo como o autor utiliza a linguagem. Raduan Nassar garimpa a língua em busca da palavra mais certa, da expressão mais pura, do conceito mais distante do comum. Daí, a trama se construir através de metáforas e repetições (atenção especial à pontuação), cuja recorrência determina o andamento e a tensão da trama, resultando em um texto que mais encontra identidade no campo da poesia que no da prosa.




Embora o filme seja muito bom, a leitura do livro torna-se imprescindível. Vejam os trechos abaixo:


"Os olhos no teto, a nudez dentro do quarto; róseo, azul ou violáceo, o quarto é inviolável; o quarto é individual, é um mundo, quarto catedral, onde, nos intervalos da angústia, se colhe, de um áspero caule, na palma da mão, a rosa branca do desespero, pois entre os objetos que o quarto consagra estão primeiro os objetos do corpo; eu estava deitado no assoalho do meu quarto, numa velha pensão interiorana, quando meu irmão chegou pra me levar de volta;"

“Desde minha fuga, era calando minha revolta (tinha contundência o meu silêncio! tinha textura a minha raiva!) que eu, a cada passo, me distanciava lá da fazenda, e se acaso distraído eu perguntasse “para onde estamos indo?” -- não importava que eu, erguendo os olhos, alcançasse paisagens muito novas, quem sabe menos ásperas, não importava que eu, caminhando, me conduzisse para regiões cada vez mais afastadas, pois haveria de ouvir claramente de meus anseios um juízo rígido, era um cascalho, um osso rígido, desprovido de qualquer dúvida: “estamos indo sempre para casa”.

3 comentários:

  1. Meu querido Ricardo,
    Seu blog, meu amigo, é lindo. Instigante em seus "achados", opressor e capitalista - enquanto não temos como aceder a todas as obras -, mas que faz deste paradoxo a transmissão da grande poética contida nos autores e trechos selecionados que são uma imensa maravilha.
    Homenageio o leitor que é você que é escritor que nos deixa ler o que toca sua alma.
    Um abração, espero que esteja bem!
    érico

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  2. Meu amigo querido, não tem o que exagerar quando é! Eu fico satisfeito, cheio, feliz de vir a seu blog! Sínteses e coletâneas falam do nosso plural. Pois que me encaixo perfeitamente nestes millhões de quadros por segundos.
    Abração daqueles zãos!

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  3. "Uma parte de mim
    pesa,pondera
    outra parte delira.
    Uma parte de mim
    almoça e janta;
    Outra parte se espanta.
    Traduzir uma parte na outra parte
    que é uma questão de vida e morte.
    Será Arte?"
    Vim te fazer uma visitinha!!!!
    abraço!!!

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