sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Será arte?

Hoje, li o curtíssimo poema de Ferreira Gullar, intitulado "Pintura". Encontrei-o no livro "Barulhos", em rápida visita a uma livraria. O que muito me chamou a atenção foi o fato de que esse maranhense-comunista, além de Poeta, é também pintor. Deixo aqui, uma réstia da mistura de suas múltiplas faces.


Pintura

Eu sei que se tocasse
Com a mão aquele canto do quadro
onde um amarelo arde
me queimaria nele
ou teria manchado para sempre de delírio
a ponta dos dedos

Dilema

A pretensão me degrada
a humildade me deprime
e assim a vida é lesada:
ora é virtude ora é crime


Traduzir-se

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
Outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?

Um comentário:

  1. Ricardo,
    é sempre um enorme prazer vir a seu blog.
    De certa forma, é um tanto surpreendente pois os contatos são sempre tão rápidos e nos vemos em fragmentos perdidos de nossas histórias. No blog vai se consolidando a sua leitura sensível, a sua escrita antenada na poética que ronda a vida e que você tão bem capta. É enormemente prazeroso vir aqui. Apreeeeendo que só...rs.. E vou feliz!
    Abração

    ResponderExcluir