quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O Ciúme e a Semiótica


“Como ciumento, sofro quatro vezes: porque sou ciumento, porque me reprovo em sê-lo, porque temo que o meu ciúme fira o outro e porque me deixo sujeitar por uma banalidade: sofro por ser excluído, por ser agressivo, por ser louco e por ser comum.” (Roland Barthes, fragmentos de um discurso amoroso).


Esta postagem é dedicada ao ciúme: "estado emocional complexo que envolve um sentimento penoso provocado em relação a uma pessoa de que se pretende o amor exclusivo; receio de que o ente amado dedique seu afeto a outrem"(Dicionário Houaiss).


Na verdade, o repentino interesse pelo tema deve-se à leitura (bem como às proveitosas discussões com o prof. Américo) do clássico Semiótica das paixões, de Greimas e Fontanille. Nesta obra, os autores se valem de um aparato teórico rigoroso, para simularem e darem conta da complexa manifestação dessa intrigante paixão humana. Sem pretensão de esgotar ou aprofundar o assunto, uma vez que minha leitura ainda é parcial, deixo aqui somente pequenos fragmentos de texto desse livro surpreendente, ainda pouco explorado pelos semioticistas:


" O ciúme aparece de súbito no fundo de uma relação intersubjetiva complexa e variável, presente por definição ao longo de todo percurso passional: o temor de perder o objeto só se compreende aqui em presença de um rival ao menos potencial ou imaginário, e o temor do rival nasce da presença do objeto de valor que funciona como pivô" (p. 171).


"Se o espetáculo fundamental do ciúme é o da junção modalizada do rival e do objeto, o ciumento é, enquanto observador, excluído da relação de junção [...]. É por isso que o sujeito ciumento se acha na impossibilidade de segmentar de outra forma o dispositivo actancial, e a cena odiada ou apreendida se lhe impõe; ele mesmo se apresenta, com relação a seu próprio simulacro passional, como sujeito virtualizado, sujeito sem corpo que não pode ter acesso à cena[...]. O observador do ciúme será efetivamente um 'espectador', isto é, observador cujas coordenadas espaço-temporais referem-se às do espetáculo que lhe é oferecido, mas que não pode, em caso algum, figurar como ator nessa mesma cena" (p. 181).

3 comentários:

  1. Interessante essa visão de que, mesmo inconscientemente, tratamos nossos amantes como um objetos de valor. Algo que conquistamos e porque não dizer que até "compramos" o outro?? Sim, pois, gastamos muito de nosso tempo e até recursos mais sofisticados para efetuarmos a tão almejada conquista.Taí talvez venha a palavra "investir" em um relacionamento??

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  2. Sou ciumenta, admito. Sinto ciúme de tudo q posso chamar de meu...livro, quarto, roupa, lápis(embora coisas não entrem na definição de Houaiss),amigo (a), até professor entra na lista (rsrs). Não pensei esse tema fosse tão interessante como parece ser no clássico Semiótica das paixões...

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  3. Comte-Spomville cita Pascal, no Tratado do Desespero e da Beatitude, no que a relação com o outro é sempre utilitaristas, a que põe reservas, mas constata a presença de um "interesse capital" nas relações. Discorre sobre "qual o objeto de desejo (utilidade) que mantém o [companheirismo]", se o corpo, o status e suas formas... e "o que será quando aquele alguém não tiver mais a beleza e outros motivos da atenção?"
    No que surge o sexo e o dinheiro como molas mestras únicas das relações, faz-se desnecessário até uma qualidade, só resta o verbo.

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