sábado, 14 de novembro de 2009

"O que você acha da poesia de Drummond?"


Para bom entendedor, estas palavras bastam:


Que noite mais comprida desde que nasci.

Viajando parado. O escuro me leva

sem nunca chegar. Sem pedir abença

como vou saber que não vou sozinho?

Que o mundo está vivo? Abença papai,

abença mamãe. Mas falta coragem

e peço pra dentro. Dentro não responde.


(Drummond, Noturno)



Confissão


É certo que me repito,

é certo que me refuto

e que, decidido, hesito

no entra-e-sai de um minuto.


É certo que irresoluto

entre o velho e o novo rito

atiro à cesta o absoluto

como inútil papelito.


É tão certo que me aperto

numa tenaz de mosquito

como é trinta vezes certo

que me oculto no meu grito.


Certo, certo, certo, certo

que mais sinto que reflito

as fábulas do deserto

do raciocínio infinito.


É tudo certo e prescrito

em nebuloso estatuto.

O homem, chamar-lhe mito

não passa de anacoluto.


(Carlos Drummond de Andrade, in 'As Impurezas do Branco')

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